Desenho Universal: eliminação de barreiras físicas arquitetônicas
Descrição da Imagem: Charge digital. Retângulo na horizontal com as bordas na cor preta e fundo branco. Acima do retângulo, no lado esquerdo está escrito hashtagacessibilidadeemcharges e no lado direito a frase: Descrição da imagem no texto alternativo. No centro do retângulo está a professora Estela. Ela está em pé, posicionada de frente para os espectadores da charge. Tem cabelos azuis presos em um rabo de cavalo e está com um par de muletas. No lado direito do retângulo, há uma mesa e no lado esquerdo um quadro, no qual está exposto o Símbolo Internacional de Acessibilidade, criado pela ONU, composto por uma figura representando um corpo humano estilizado com braços e pernas abertos, formada por traços na cor preta constituindo o corpo e círculos pintados com a cor azul representando a cabeça, os braços e os pés. O corpo está envolto por um círculo maior na cor preta. Acima da professora Estela está seu balão de fala com os dizeres: Hoje eu quero conversar com vocês sobre esse símbolo que foi inspirado na obra homem vitruviano de Leonardo da Vinci…
As barreiras encontradas nos espaços físicos e nas estruturas arquitetônicas são muitas e, faz parte do dia a dia das Pessoas com Deficiência ter que vivenciá-las. A forma como os espaços são construídos reflete os padrões estabelecidos culturalmente e se alteram com o passar do tempo, conforme o interesse de grupos dominantes, os quais visam contemplar um único perfil de indivíduo, desconsiderando a diversidade humana.
Na contramão dessa lógica excludente, surgem várias perspectivas para romper com a cultura capacitista [Nota 1] e incluir a participação social de indivíduos que não cumprem com os padrões corponormativos. Uma forma de eliminar as barreiras é pela aplicação dos princípios do Desenho Universal (DU). A partir desse conceito é possível questionar os padrões estabelecidos e as formas de participação no uso dos espaços.
Para melhor compreender como se constituem as barreiras arquitetônicas é importante atentar aos padrões inventados e utilizados em construções no decorrer da história. Ao estudar a criação de proporções para a construção de espaços ao longo dos séculos observa-se sistemas cujas formas de medida padronizam e consideram questões estéticas antes das questões funcionais, pois associam os espaços a um tipo de ser humano padrão. Segundo Francis D. K. Ching (1998), os principais sistemas são: Secção áurea (Antiguidade); Ordens clássicas; Teorias Renascentistas; Modulor (século XX).
A discussão sobre o DU teve início na segunda metade do século XX. Em 1961 ocorreu a conferência internacional sobre o tema na Suécia, e, “em 1963 foi criada em Whashington a Barrier-free Design, comissão que se constituía de corrente de discussão voltada para o desenho de equipamentos, edifícios e áreas urbanas adequadas à utilização por pessoas com alguma deficiência ou com mobilidade reduzida”. (GABRILLI, 2016, p.8).
No Brasil, a primeira publicação de uma orientação técnica sobre acessibilidade dos espaços ocorreu em 1985, intitulada Norma Técnica Brasileira (NBR) 9050, foi atualizada em 2020, e dá diretrizes para Acessibilidade a Edificações, Mobiliário, Espaços e Equipamentos Urbanos. Ao longo dos anos as NBRs foram aprimoradas e reverberaram em outras normativas e legislação. Em 2004, foi promulgado o Decreto 5.296, que regulamenta as leis de acessibilidade levando em conta o DU. Contudo, tem-se a problemática acerca de sua aplicação, que ocorre muitas vezes, como forma de adaptar espaços já projetados, não como diretriz de projeto.
O DU é considerado um facilitador para a eliminação de diversos tipos de barreiras na origem da elaboração de um produto, obra arquitetônica ou serviço. De acordo com a Cartilha Acessibilidade na Web do W3C ([2013], p. 23) “O fundamento teórico mais relevante para o conceito de acessibilidade é o Desenho Universal, que é o desenvolvimento de produtos e ambientes para serem usáveis por todas as pessoas, na maior extensão possível, sem a necessidade de adaptação ou desenho especializado.”
Diferente das Tecnologias Assistivas e da Legislação que prevê os direitos das Pessoas com Deficiência, o DU tem um propósito ampliado, seu conceito principal é contemplar o maior número de características humanas possível. Ele não busca atender apenas um perfil específico e dessa forma acaba beneficiando as pessoas sem deficiência, mas sendo a garantia de acesso das Pessoas com Deficiência.
Com o intuito de contemplar a diversidade funcional dos indivíduos, o Desenho Universal estabelece sete princípios, abordados abaixo (adaptação feita a partir de W3C, [2013]; GABRILLI, 2016):
- Igualitário – Equiparação nas possibilidades de uso de objetos, espaços e produtos que podem ser utilizados por uma diversidade de usuários, com diferentes capacidades, em condições equivalentes;
- Adaptável – Flexibilidade de uso de produtos ou espaços que atendem a uma ampla gama de indivíduos, preferências e habilidades individuais;
- Óbvio – Uso simples e intuitivo, para que as instruções de uso sejam fáceis de compreender, independentemente da experiência do usuário, de seus conhecimentos, aptidões linguísticas ou nível de concentração;
- Conhecido – Informação perceptível fornecida de forma eficaz, quaisquer que sejam as condições ambientais/físicas existentes, as capacidades sensoriais do usuário (ex: pessoas surdas ou com deficiência visual) ou a nacionalidade;
- Seguro – Tolerância ao erro, quando o produto ou serviço é previsto para minimizar riscos e consequências negativas decorrentes de ações acidentais ou involuntárias;
- Sem esforço – Mínimo esforço físico para o uso de forma eficiente e confortável, com um mínimo de fadiga;
- Abrangente – Dimensão e espaço adequados para o acesso, o alcance, a interação, o manuseio e a utilização, independentemente da estatura (obesos, pessoas com nanismo etc.), da postura ou da mobilidade (pessoas em cadeira de rodas, com carrinhos de bebê, bengalas etc.).
O DU prevê que seja considerado o maior número possível de características das pessoas no desenvolvimento de algum projeto, rompendo com a ideia de padrão para o corpo humano. Ao utilizar-se desse conceito os projetos já são pensados para a diversidade humana no início de seu planejamento, não necessitando de adaptações posteriores. Para identificação de ambientes, produtos e serviços que contemplam a diversidade de corpos foi criado pela ONU, em 2015, o Símbolo Internacional da Acessibilidade. Ele é considerado um símbolo equitativo, que contempla todas as características das Pessoas com Deficiência e utiliza o símbolo do homem vitruviano como forma de contestação. No Brasil, em 2019, foi aprovado o Projeto de Lei 7750/17, que obriga que ele substitua o usual símbolo de um cadeirante sobre fundo azul ou preto (AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS, 2019).
O DU se caracteriza como uma forma humanizada de pensar e prover projetos de diversas naturezas. Tratando-se do contexto institucional, no qual se situam as bibliotecas universitárias, a adoção da perspectiva do DU no desenvolvimento das ações e na estruturação dos serviços possibilita que o usuário com deficiência seja acolhido e a biblioteca cumpra seu papel enquanto espaço democrático de acesso à informação e ao conhecimento.
[Nota 1] Para compreender melhor sobre as práticas capacitistas leia o texto da CABU A luta das pessoas com deficiência: impactos acadêmicos e desdobramentos políticos publicado em Dezembro de 2020.
Referências:
AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS. CCJ aprova adoção de novo ícone para sinalizar acessibilidade. Brasília: Câmara dos Deputados, 2019. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/616449-ccj-aprova-adocao-de-novo-icone-para-sinalizar-acessibilidade/ Acesso em 07 out. 2021.
CAMBIAGHI, Silvana. Desenho universal: métodos e técnicas para arquitetos e urbanistas. 4. ed. rev. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2019. Disponível em: https://url.gratis/fQyZTB Acesso em 06 out. 2021.
CARLETTO, Ana Claudia; CAMBIAGHI, Silvana. Desenho universal: um conceito para todos. Realização de Mara Gabrilli. São Paulo: [s.n.], [2007]. Disponível em: https://www.maragabrilli.com.br/wp-content/uploads/2016/01/universal_web-1.pdf Acesso em: 06 out. 2021.
CHING, Francis D. K. Arquitetura, Forma, Espaço e Ordem. São Paulo: Martins. Fontes, 1998.
W3C BRASIL. Cartilha Acessibilidade na WEB: Fascículo I: Introdução. São Paulo: W3C Brasil, nic.br, cgi.br, [2013]. Disponível em: https://www.w3c.br/pub/Materiais/PublicacoesW3C/cartilha-w3cbr-acessibilidade-web-fasciculo-I.pdf Acesso em: 03 set. 2021.
Por Comissão Por uma BU Acessível (CABU)
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Outubro, 2021